Reforma das Regras de Responsabilidade Civil no Código Civil
O Projeto de Lei 4/2025, atualmente em análise no Senado, traz mudanças significativas nas regras de responsabilidade civil. O objetivo é tornar mais claras as condições para a reparação de danos e introduzir novos conceitos importantes.
Função Pedagógica e Remoção de Lucros
Uma das inovações inclui, pela primeira vez, a função pedagógica nas condenações por danos morais. Com isso, busca-se não apenas compensar as vítimas, mas também educar o ofensor sobre o impacto de suas ações. A proposta permite a remoção dos lucros obtidos com atos ilícitos, mesmo quando a vítima não sofre um prejuízo material direto.
Cálculo das Indenizações
O artigo 944, que trata do valor das indenizações, ganhará um novo parágrafo. Agora, a vítima poderá escolher entre receber um quantia razoável pela violação de um direito, ou, quando necessário, a devolução dos lucros obtidos pelo infrator.
Essa mudança muda a abordagem tradicional, que focava apenas na recompensação do dano sofrido. Agora, o ganho econômico do ofensor poderá ser devolvido, mesmo sem provas de danificação financeira direta à vítima.
O novo artigo 944-B também reconhecerá a “perda de uma chance” como um tipo de dano que pode ser indenizado. Nesse caso, o valor deverá ser calculado com base na fração dos benefícios que essa oportunidade poderia ter gerado.
Outra novidade é a permissão para que o juiz possa estimar o valor do dano em situações em que a prova exata se torne muito difícil ou cara, desde que o prejuízo em questão não seja de grande valor econômico.
Critérios para Dano Moral e Função Pedagógica
O artigo 944-A delineia como os danos extrapatrimoniais são tratados e os critérios para sua quantificação. Essa quantificação considera a natureza do bem jurídico afetado, o impacto na vida da vítima e a intensidade da ofensa.
Além disso, um novo parágrafo permite que o juiz imponha uma sanção pecuniária de caráter pedagógico em casos de dolo, culpa grave ou reincidência em condutas prejudiciais. Se necessário, a sanção pode ser aumentada até quatro vezes o valor do dano moral, levando em conta a situação financeira do ofensor.
As seções adicionais instruem os juízes a considerar condenações anteriores e há a previsão de que uma parte do valor resulte em fundos públicos ou entidades assistenciais na região do dano. Essa abordagem reforça a intenção de educar o infrator e prevenir condutas lesivas.
Tutela Preventiva e Dever de Evitar Danos
O artigo 927-A introduz a chamada tutela preventiva do ilícito. Isso significa que quem cria uma situação de risco deve tomar medidas para evitar danos previsíveis. O objetivo é impedir a repetição ou agravamento de condutas ilícitas, independentemente de dolo ou culpa.
Essa norma busca alinhar o Código Civil a uma lógica de prevenção e gestão de riscos, incentivando políticas de compliance e governança nas empresas. Assim, há um chamado claro para que as instituições e pessoas ajam de forma consciente.
Reações e Reflexões do Mercado e do Mundo Jurídico
As propostas têm gerado reações cautelosas entre advogados e representantes do setor empresarial. Especialistas alertam que a junção de sanções pedagógicas, multiplicação de indenizações e a consideração da capacidade econômica do ofensor podem causar incertezas sobre o valor das condenações. Isso poderia, inclusive, aumentar os custos de litígios e seguros.
Contudo, há quem considere que as propostas trazem maior clareza e objetividade. Além disso, incorporam objetivos preventivos e educativos já reconhecidos pela jurisprudência.
Critérios e Técnicas Já Usados nos Tribunais
Para minimizar divergências na interpretação da nova lei, o projeto retoma critérios já aplicados em tribunais. O critério bifásico de arbitramento, utilizado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), será formalizado. Isso combina a avaliação da gravidade do dano com a análise de casos anteriores.
O texto também orienta que os juízes fundamentem suas decisões em relação a fatores que alterem o valor da indenização, sejam eles de majoração ou de redução, com base na gravidade e nas circunstâncias específicas do caso.
Aplicações em Ambientes Digitais e Concorrenciais
Com a nova regra que permite a fixação de um montante razoável pela violação de um direito ou a remoção de ganhos indevidos, é esperado um impacto significativo em contextos de proteção de dados, uso de plataformas digitais e relações de concorrência.
Especialistas acreditam que, nesses casos, os lucros ilícitos podem ser superiores ao dano direto. Assim, as novas regras fornecem ferramentas para neutralizar as vantagens econômicas resultantes de práticas ilegais.
Tramitação e Próximos Passos
O Projeto de Lei 4/2025 continua a sua tramitação nas comissões do Senado. O texto prevê um período de vacatio legis de 365 dias após a aprovação e publicação, tempo necessário para a adaptação de contratos, apólices e políticas internas às novas regras.
Esse período permitirá uma implementação gradual e a revisão de programas de conformidade, assegurando que as mudanças sejam aplicadas de forma eficaz e responsável.
Essas alterações no Código Civil visam não apenas modernizar a legislação, mas também promover uma cultura de responsabilidade e prevenção, beneficiando a sociedade como um todo.
