Curso de Medicina da UFPE: Uma Iniciativa de Inclusão Social e Saúde Rural
Recentemente, a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) deu um passo importante no ensino superior do Brasil ao anunciar a criação do primeiro curso de Medicina voltado exclusivamente para assentados da reforma agrária, quilombolas e membros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Previsto para começar em dezembro de 2025, o curso disponibilizará 85 vagas no Campus do Agreste, em Caruaru, e tem uma característica inédita: não exigirá nota do ENEM para a entrada.
Objetivo do Curso: Saúde Pública no Campo
O principal objetivo dessa iniciativa é formar médicos com foco na saúde de comunidades rurais e isoladas, que frequentemente enfrentam a falta de profissionais de saúde. O edital da universidade informa que o processo de seleção será diferente do Sistema de Seleção Unificada (SISU). A seleção envolverá a análise do histórico escolar e uma redação, sem necessidade de nota do ENEM.
Essa proposta deve-se a uma colaboração entre a UFPE, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), todos alinhados às diretrizes do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera). Criado em 1998, o Pronera tem a meta de facilitar o acesso à educação para famílias em assentamentos rurais, oferecendo cursos desde alfabetização até pós-graduações.
Metas e Expectativas para os Estudantes
Com a proposta de fortalecer a atenção primária à saúde no campo, o curso visa formar profissionais comprometidos com suas comunidades. A expectativa é que as aulas se iniciem em outubro de 2025 e a duração total do curso seja de seis anos, seguindo o padrão dos cursos de Medicina do Brasil.
Debate Sobre os Critérios de Seleção
A criação deste curso gerou controvérsia e debate intenso entre profissionais da área acadêmica e médica. Entidades como o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Médica Brasileira (AMB) expressaram preocupações sobre a escolha de não exigir o ENEM. Argumentaram que isso poderia afetar a qualidade e a meritocracia na seleção dos alunos.
Em contrapartida, defensores do projeto, incluindo membros da universidade e do governo federal, afirmaram que a proposta atende a padrões rigorosos de ensino e representa uma ação de reparação social. A coordenadora do curso, Maria do Socorro Carvalho, esclareceu que a proposta não visa criar um “atalho”, mas dar a pessoas de origem rural a chance de se formarem e atenderem às necessidades de suas comunidades.
O reitor da UFPE, Alfredo Macedo Gomes, também enfatizou que o curso foi aprovado pelo Conselho Universitário e respeita todas as diretrizes do Ministério da Educação (MEC). Ele argumentou que a formação oferecida será de qualidade, com médicos preparados tecnicamente e socialmente.
Estrutura e Metodologia do Curso
O curso de Medicina da UFPE será em tempo integral e incluirá uma combinação de aulas teóricas, práticas e módulos de campo realizados em unidades básicas de saúde do interior de Pernambuco. O currículo terá foco em saúde pública rural, atenção primária e gestão de políticas de saúde em comunidades vulneráveis.
Os estudantes contarão com apoio pedagógico, psicológico e moradia durante a formação. O programa também prevê colaborações com universidades internacionais que são especializadas em medicina comunitária, como a Universidad de Ciencias Médicas de La Habana, em Cuba. Isso permitirá intercâmbios e capacitação de docentes.
A primeira turma do curso terá 45% de mulheres e incluirá jovens oriundos de assentamentos rurais do Nordeste. Os candidatos deverão comprovar vínculo com o MST, com o Incra, ou com programas de agricultura familiar para garantir a inclusão.
Repercussão Nacional e Impacto Social
A novidade chamou a atenção da imprensa nacional, sendo divulgada por veículos como JC Online e G1 Pernambuco. O curso é visto como um marco na democratização do ensino superior, sendo o primeiro da área médica com um foco social e territorial claro.
O Ministério da Educação também elogiou a iniciativa, conforme alinhada à Política Nacional de Educação do Campo, que busca diminuir as desigualdades no acesso à educação. Representantes do MST consideram a criação desse curso como um passo significativo na luta pela igualdade educacional e pelo direito à saúde rural.
Além disso, o governo vê o projeto como um modelo que pode inspirar outras universidades em diferentes estados a implementar cursos semelhantes, especialmente nas áreas de enfermagem, odontologia e agronomia. Isso pode ajudar a expandir o acesso ao ensino superior para comunidades historicamente marginalizadas.
Um Marco na Educação Pública Brasileira
Por fim, o curso de Medicina da UFPE destinado a membros do MST revela a complexa relação entre educação, políticas públicas e equidade social no Brasil. Ele reflete o esforço para levar o ensino superior a grupos que frequentemente são excluídos, ao mesmo tempo em que provoca uma discussão necessária sobre critérios de acesso e qualidade acadêmica.
Independentemente das opiniões divergentes, a UFPE está abrindo um novo precedente ao criar um curso de Medicina sem ENEM, integrado a um projeto que junta inclusão social e políticas públicas. Esse passo pode transformar o cenário educacional brasileiro, trazendo novas oportunidades para os envolvidos e contribuindo para a saúde e bem-estar das comunidades rurais.
